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quinta-feira, 17 de março de 2011

FLORES DE AÇO - HILDA HILST


fundição de ferro as folhas e flores








“Deus pode ser uma negra noite escura, mas também um flambante sorvete de cerejas”
Frase de Hilda, dita ao escritor Caio Fernando Abreu

Paulistana de Jaú, nascida no dia 21 de abril de 1930 e falecida a 4 de fevereiro de 2004, Hilda Hilst é reconhecida, quase pela unanimidade da crítica brasileira, como uma das nossas principais autoras, sendo consideradas uma das mais importantes vozes da Língua Portuguesa do século XX. Segundo o crítico Anatol Rosenfeld, “Hilda pertence ao raro grupo de artistas que conseguiu qualidade excepcional em todos os gêneros literários que se propôs - poesia, teatro e ficção”.

Distinguida por vários de nossos mais significativos prêmios literários, presente em numerosas antologias de poesia e ficção, tanto nacionais como estrangeiras, há muito seu nome está incluído nos dicionários de autores brasileiros contemporâneos.
De temperamento transgressor, prezando a liberdade, dona de uma rara beleza e coragem, culta e poeta, Hilda teve uma personalidade marcante e sedutora que ia de encontro aos costumes tradicionais vigentes nos anos 50, criando-se um folclore ao seu redor que, segundo alguns críticos, até chegou a ofuscar a importância de sua obra.

Seu trabalho vem sendo publicado pela Editora Globo e tem sido tema de teses universitárias em nível de pós graduação e merecido traduções para o francês, inglês, espanhol, alemão e italiano, atraindo a atenção da crítica internacional, que já lhe dedicou artigos no Le Monde, L’infint, Libération, The Antigonish Review, Pleine Marge, entre outros.

Iniciando sua ascese literária como poeta (seu primeiro livro, Presságio, é de 1950), Hilda Hilst estreou na dramaturgia em 1967, passando a representar o Brasil em festivais de teatro no exterior, entre eles o Festival de Manizales, Colômbia. Também por várias vezes suas peças teatrais, pela excelência do texto, têm sido utilizadas nos exames da Escola de Arte Dramática da Universidade de São Paulo (EAD- USP) e da Unicamp.

Ao iniciar sua ficção, em 1970, com o livro Fluxo Floema, inaugura também um momento raro na Literatura Brasileira pela vigorosa revitalização da linguagem, que utiliza como meio de desestruturação, reformulação e catarse, para afinal reconstruir a Idéia (o Homem) dentro de novos limites. Seguiram-se vários outros livros no gênero.

Criadora de textos magníficos, onde Atemporalidade, Real e Imaginário se fundem e os personagens mergulham no intenso questionamento dos significados, buscando compreensão, resgate da raiz, encontro do essencial, Hilda retrata sem cessar nossa limitada/ilimitada, frágil e surpreendente condição humana. Segundo o crítico literário Léo Gilson Ribeiro, a ficção de Hilda Hilst “submerge o leitor num mundo intrépido de terror e tremor, de beleza indescritível e de uma fascinante prospecção filosófica sobre o Tempo, a Morte, o Amor, o Horror, a Busca”.
A abrangência de linguagem conseguida por Hilda Hilst, capaz de abarcar o coloquial mais chulo e a poesia mais intensa, alia-se à complexidade do Universo da autora, tornando-a uma das mais importantes vozes para descrever, com profunda e comovente fidelidade, a solidão, perplexidade e grandeza do Homem diante do Mundo.

CRONICA: E.G.E. (ESQUADRÃO GERIÁTRICO DE EXTERMÍNIO).

(Segunda-feira, 3 de maio de 1993)

O poeta pode ser violento. A maior parte das vezes contra si mesmo. Um tiro no peito, gás, veneno, um tiro na boca, como fez Hemingway, que também foi poeta em O Velho e o Mar; Maiakóvski, um tiro no peito; Sylvia Plath, gás de cozinha; Ana Cristina César, um salto pelos ares; etc etc etc. "Os delicados preferem morrer", dizia Drummond. Mas esta modesta articulista, sobretudo poeta, diante das denúncias feitas pela revista Veja, todos aqueles poços perfurados em prol de uma única pessoa ou em prol de amiguelhos de sua excelência, presidente da Câmara, senhor Inocêncio (a indústria da seca), e o outro com seu lindo carro às custas de gaze e esparadrapo... Credo, gente, quando você vê televisão ou in loco o povão famélico, desdentado, mirrado... Um amigo meu foi para o Ceará e passou os dias chorando! As crianças todas tortas, todos pedindo comida sem parar... e 500 toneladas de farinha apodrecendo... e montes de feijão desviados para uma só pessoa... (um parênteses, porque meu coração de poeta pede a forca, o fuzilamento, cadeia, cadeia para aqueles que se locupletam à custa da miséria absoluta, da dor, da doença). Gente, eu já estou uma fúria e para ficar mais calma proponho algumas coisas mais sutis, por exemplo: o Esquadrão Geriátrico de Extermínio, a sigla óbvia seria EGE. Arregimentaríamos várias senhoras da terceira idade, eu inclusive, lógico, e com nossas bengalinhas em ponta, uma ponta-estilete besuntada de curare (alguns jovens recrutas amigos viajariam até os Txucarramãe ou os Kranhacarore para consegui-lo) nos comícios, nos palanques, nas Câmaras, no Senado, espetaríamos as perniciosas nádegas ou o distinto buraco malcheiroso desses vilões, nós, velhinhas misturadas às massas, e assim ninguém nos notaria, como ninguém nunca nota a velhice. Nossas vidas ficariam dilatadas de significado, ó que beleza espetar bundões assassinos, nós faceiras matadoras de monstros!

O curare é altamente eficiente, provoca rapidinho a paralisia completa de todos os músculos transversais (bunda é transversal?) e em seguidinha sobrevém a morte por parada respiratória. Ficaríamos todas ao redor do coitadinho, abanando: óóóó, morreu é? Um pedido ao presidente Itamar: severidade, excelência, é ignominioso, indigno, insultante para todos nós, deste pobre Brasil tão saqueado, que essas terríveis denúncias terminem no vazio, no nada, na impunidade. É sobretudo perigoso porque:



de cima do palanque

de cima da alta poltrona estofada

de cima da rampa

olhar de cima



LÍDERES, o povo

Não é paisagem

Nem mansa geografia

Para a voragem

Do vosso olho.

POVO, POLVO

UM DIA.



O povo não é o rio

De mínimas águas

Sempre iguais.

Mais fundo, mais além

E por onde navegais

Uma nova canção

De um novo mundo.



E sem sorrir

Vos digo:

O povo não é

Esse pretenso ovo

Que fingis alisar,

Essa superfície

Que jamais castiga

Vossos dedos furtivos.

POVO. POLVO.

LÚCIDA VIGÍLIA.

UM DIA. fundição de ferro as folhas e flores

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